O Brasil nas salas de aula italianas
                                            
            
Erika Piacentini Zidko
Jornalista brasileira jornal Agora de Roma.
Roma 2004



Dayse Angela do Nascimento Azevedo
             Ajudar as crianças italianas a conviverem e, principalmente, a apreciarem as diversidades étnicas utilizando a cultura brasileira como pano de fundo. Esta é a proposta da atriz Dayze  Nascimento, que desde 1994 realiza laboratórios lúdicos para alunos de 4 a 14 anos em diversas escolas públicas de Roma. “A ideia é usar a miscigenação característica da nação brasileira para colaborar com os educadores italianos no processo de construção de uma sociedade “Inter-cultural”, explica a carioca que importou seus personagens e suas técnicas teatrais para dentro das salas de aula italianas.

            Multi-etnicidade, integração, tolerância, diversidade cultural são palavras cada vez mais presentes no cotidiano dos italianos, e não por acaso. A Itália, que num passado não muito remoto era conhecida como país de emigrantes, conta hoje com 2,5 milhões de estrangeiros regulares em seu território, o que representa 4,5% da população total. A questão da convivência com tradições e costumes diferentes não é, portanto, restrita às faixas adultas da sociedade. Ao contrário, diz respeito principalmente às crianças. E se há 20 anos o número de estrangeiros a ocuparem os bancos escolares italianos correspondia a apenas 0,06%, hoje, a cada dez alunos, três são filhos de imigrantes.

             Neste contexto, a prefeitura de Roma tem promovido diversas iniciativas para fomentar a educação inter-cultural, entre elas a introdução de novas figuras profissionais nas escolas e a adoção de novas atividades no curriculum do ensino fundamental e médio, entre elas as oficinas lúdicas realizadas pela atriz brasileira.

        Aprendendo com o Brasil - Para guiar as crianças nesta descoberta de novas etnias, Dayze desenvolveu um programa “Livro Vivo Itinerante” que vai além da função narrativa pedagógica. Através de seus laboratórios, o percurso de leitura ganha vida e as estórias sobre o Brasil criadas pela autora são interpretadas pelos próprios alunos, utilizando recursos como a música, a dança, a construção de instrumentos musicais e a representação teatral.


        Samba de uma nota só - Além de propiciar a socialização entre os alunos, os laboratórios desenvolvidos por Dayse servem de suporte para disciplinas clássicas como história, geografia, entre outras. “Trata-se de uma metodologia interdisciplinar. O teatro engloba tudo; ajuda o processo de alfabetização, através do reconhecimento fonético das sílabasa percepção espacial, através da reconstrução de diferentes ambientes e cenários; a capacidade de relacionamento, através da interpretação de personagens, entre outras áreas essenciais para o desenvolvimento e aprendizagem infantil”, explica a autora.

            As oficinas, realizadas durante o horário das aulas, são incluídas no programa de ensino como parte de outras disciplinas. “Devido à grande contribuição das técnicas teatrais ao desenvolvimento da capacidade de comunicação e expressão, os professores de língua italiana são os que mais recorrem aos nossos laboratórios’, explica a atriz.  Apesar dos laboratórios terem como referência a multi-etnicidade brasileira, os princípios básicos, ou seja, os valores de solidariedade, a apreciação de culturas diferentes, o respeito aos direitos humanos e ao ambiente onde se vive, podem ser transportados para qualquer realidade cultural”, afirma a autora.

          Lição de casa – No Brasil, apesar da multi-etnicidade da população constituir um motivo de orgulho nacional, somente há alguns anos temas como a cultura indígena e africana passaram a integrar o curriculum escolar. “Durante a minha educação, estas culturas eram praticamente escondidas, perseguidas. Os livros escolares sempre retrataram a história do Brasil sob o ponto de vista dos europeus”, confirma a brasileira de origem afro-indígena. “Poder divulgar as minhas origens e tradições, além de ser um motivo de orgulho, comprova a capacidade de resistência destas culturas apesar das inúmeras opressões sofridas ao longo da história”, diz ela. “Felizmente, o sistema educacional brasileiro começa a valorizar a nossa diversidade cultural”, afirma a atriz, que em 1997 foi convidada a levar seus laboratórios a professores e alunos da rede municipal de ensino do Rio de Janeiro, em ocasião do terceiro centenário da morte de Zumbi dos Palmares. Após ter levado as suas oficinas de cultura brasileira a alunos de mais de cinqüenta escolas italianas, em 2004 Dayse passou a transmitir a sua experiência também aos docentes italianos.